sábado, 29 de junho de 2013

Suspender.

http://www.youtube.com/watch?v=P1yUQJj7NbI






                                                         ( La Campagne. Karl Albert Buehr)

                                              Um silêncio com sabor a mar e a nunca.
                                              Ressuscitar dentro de um livro caído no colo.
                                              Sob a luz crepuscular inventar um tempo branco.
                                              Suspender a respiração, suspender o desejo, suspender a vida.
                                              Chegará a noite, e o sono, trará o sonho
                                               e o que agora se suspende tornará a pulsar.

                                                   

quinta-feira, 27 de junho de 2013

A súplica, o pedido e a exigência. (I'm Not Gonna Beg - Natalie Merchant)






Nas relações entre os seres humanos existem várias formas para cada um obter do outro aquilo que pretende.
Todos pretendem coisas de outros, sejam elas coisas materiais, ou de outra natureza.
A questão está em analisar a maneira como se alcançam essas pretensões.
"Hamlet" de Shakespeare, apresenta-nos a cisão profunda entre dois modos de obter aquilo que se quer, Hamlet, tal como o seu Pai, pertencem a um modo antigo de agir, um modo que defende o conflito aberto, a luta, e onde o vencedor é o melhor no campo de batalha, já Claudio, seu tio, defende a diplomacia ( ou a intriga e a conspiração) como método. Neste conflito de posturas podemos observar, em condensado, uma das grandes questões da civilização ocidental, substituir o conflito pela diplomacia, é aparentemente um salto qualitativo, enquanto um dependeria apenas da força bruta, o outro teria como recurso, a inteligência e a capacidade de criar estratégias. Mas a história não é um processo linear. Avança, recua, encaracola-se e por vezes retoma o seu passo.
Em tempo de confrontos, a súplica pode ser uma possibilidade de sobrevivência, nomeadamente quando a relação de forças entre o suplicante e o seu destinatário for uma relação de desequilíbrio. Num tempo de diplomacia, o pedido seria  a fórmula mágica que permitiria a realização da vontade das partes, o pedido, a negociação e a conciliação, este eixo apresenta-se como o mais satisfatório para as partes, mas se a diplomacia for a arte do engano, da traição e da intriga, então talvez seja tudo uma construção cénica, um gigantesco telão pintado representando uma bela frontaria, feito de pau e tela, se assim for, então estamos no final do baile de máscaras, revelam-se rostos horrendos, temporariamente escondidos.
 Se a história fosse cíclica, retomaríamos o tempo do confronto, força bruta versus força bruta, mas a história faz o seu caminho como as raízes das árvores,  desenvolve-se
onde encontra espaço propício, seja no esgoto ou entre as pedras.
 Se para alguns  é imprescindível exigir, outros estão disponíveis para suplicar, e poucos são os que acreditam na força da simplicidade do pedido.
Um mundo onde aumentam os suplicantes e explodem os exigentes mas no qual os governantes parecem alheados do eco das súplicas e das exigências, um mundo de onde desapareceu o pedido,  por ter perdido a sua dignidade semântica.
Muitos confrontos se adivinham mas também coros de súplicas ecoarão nas cidades onde os pedidos deixaram de ser escutados.





terça-feira, 25 de junho de 2013

Do abandono e de um roseiral na memória. "Crazy" (Gnarls Barkley) - Angela Ricci






A velha casa e a velha senhora e a velha empregada abandonaram-se umas às outras.
A velha senhora abandonou a casa, a velha casa abandonou-se ao lento mastigar da hera, a velha empregada, abandonada, preserva as passadeiras e encera repetidas vezes um chão que já ninguém pisa.
A morte é mais evidente na terra, ali, no lugar do roseiral, conhecem-se agora os limites de um muro outrora coberto por vegetação.
A luz ilumina a ausência.
Garrafas demasiado reais e demasiado recentes,  num chão agora ressequido.
 Um som de cigarras confirma a sentença de um Estio abrupto.
Espectadores da decomposição, portas forçadas, segredos procurados, e o abandono a comer as paredes. Uma casa morre quando dentro dela já não ecoam risos de crianças.

domingo, 16 de junho de 2013

Senhora das horas. Jeff Buckley - Calling you






-Foi ontem. Tenho disso uma certeza absoluta.
- Ah sim? e como se apercebeu?
- O gato voltou a entrar pela portinhola da cozinha e saltou para a cama, deviam ser uma cinco ou seis da manhã.
- E não é habitual o gato fazer isso?
- É, é habitual, o que não é habitual é eu estar a dormir quando isso acontece.
- Tem dificuldades em adormecer, portanto.
- Não, não é bem isso, tenho dificuldades em manter o sono. Adormeço com relativa facilidade. Mas qualquer pequeno ruído me desperta e a partir daí começa o dia.
-Começa o dia?
- Sim, ou melhor, começo o dia, saio da cama pé ante pé, e depois tomo conta das horas, sabe a partir do nascer do sol elas tornam-se mais rebeldes.
- Elas?
- As horas senhor agente, as horas, gosto especialmente daquelas horas antes do abominável chilrear dos pássaros. Estão ali, ao meu inteiro dispor, sem nada que as ameace.
- E o seu marido? o seu marido sabe do seu problema com o sono?
- Talvez, agora já não lhe vamos perguntar, seria insensível da nossa parte.
- Mas ele nunca  tinha acordado quando a senhora se levantava, durante a noite?
- Não senhor agente, foi a primeira vez que ele me fez tamanha provocação, mas eu mostrei-lhe que não voltaria a tolerar semelhante invasão.

( o gato não voltou a entrar pela portinhola da cozinha)



sexta-feira, 14 de junho de 2013

Um deserto a crescer no fundo da alma.




http://youtu.be/acDKuIx7pqw



Não se atravessa o deserto
uma vez chegados ao deserto, aí permanecemos
ainda que a água nos invada, uma e outra vez,
a areia resguarda-se no fundo da alma
sem tréguas possíveis.






terça-feira, 11 de junho de 2013

não tenho verdades



Se soubesse de um tempo onde o próprio tempo parasse, seria aí onde te diria, não tenho verdades nem guardo certezas, apenas amores, rancores e distâncias e pó.
Perdoa-me não ter uma estrada pintada, nem uma flauta para te conduzir.














http://youtu.be/9AKQTFM-6hg

sexta-feira, 7 de junho de 2013

sinfonias incompletas

                      


                                             ( Henri Matisse)


 Era assim a paisagem
Gosto da ideia de landscape
Uma fuga sem dó maior
Ali, por dentro das árvores pintadas
Corriam, rumo à salvação
uma salvação apenas  esboço,
compete-nos  ajudar-vos a transitar do esboço para a obra.
a vós, filhos, compete-vos o caminho.



http://youtu.be/ZHajIDHr4Cc