domingo, 4 de novembro de 2012

Na esquina dos dias que findam, espera-nos o regresso da barbárie.

Tenho tentado adormecer-me na poesia, já que a realidade está cada vez mais vulgar, encarniçada e escarnecida. Exilei-me num canto, que não era nono, e dei à costa num brutal embate entre corpo e rocha. Que não restem dúvidas, está em causa a civilização. Já não se trata apenas, de um modus vivendi versus outro. Na esquina dos dias que findam, espera-nos o regresso da barbárie, a lei do mais forte, a natureza em tom cruento, sem eufemismo possível. Desmantelar o estado social é muito mais do que reduzir na despesa, é um projecto social com contornos de abismo. Desmantelar o estado social não é somente deixar de garantir a saúde tendencialmente gratuita, a educação para todos, as reformas para quem trabalhou e as protecções para grupos específicos, é rasgar o pacto entre os homens, o pacto que evita a ira do esfomeado contra o banqueiro. É aninhar a raiva e acordar a barbárie. A evolução física da humanidade retirou-nos força bruta e fomos aperfeiçoando a utilização de outras skills( aptidões, ferramentas) mais apropriadas a vida em comunidade que, julgámos nós, se teria tornado menos hostil. Mas se se interromper a evolução, constrangendo a humanidade, o instinto de sobrevivência, inerente a todas as espécies que não se abandonam à extinção, voltará a fazer crescer garras no fundo das nossas mãos e os caninos voltarão a afiar-se. Claro que não será imediato, uma ou duas gerações possuirão ainda skills desadaptadas da realidade, esses transformar-se-ão em presas fáceis, gazelas impotentes. O mundo em construção é sobretudo um mundo em colapso, uma extinção programada da civilização, os novos bárbaros nada têm de doce e já por aí andam com palavras em forma de pedras lascadas.

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