domingo, 19 de janeiro de 2014

As últimas palavras.

Raiava o dia quando lhe bateram à porta.
-Vimos confiscar as suas últimas palavras.
-Mas eu...
-Entregue-as de livre vontade.
-Mas... eu...
- Está a tornar as coisas mais difíceis, vamos ter que lhe tirar as palavras recorrendo à força. Colabore connosco.
- Mas...
Tinha sido um processo gradual. Primeiro começaram as falhas episódicas, depois ela própria tinha oferecido palavras ao vento, esperando vocábulos novos trazidos pelo sopro longínquo, mas a resposta chegava em forma de silvado sem contorno ou verbo.
E depois vieram apreender-lhe as primeiras palavras, dessa vez enrolou-as em papel de seda e entregou-as como se entregasse um filho, da segunda vez que vieram fazia sol mas já não tinha a palavra luz.
Depois desta última visita, tornou-se quase impossível contar o que lhe aconteceu.
Sem verbos, deixou se ser, restava-lhe estar. S
entou-se debaixo da velha pinheira mansa, alegrando-se em longos sorrisos e fechares de olhos, conhecendo na pele as transformações trazidas pelo vento, pelo sol, pela chuva e pela lua.

http://youtu.be/2XbNt5ahKPM

6 comentários:

  1. O verbo é o cofre que guarda a nossa humanidade.
    A palavra apaga-se, o mundo diminui. Restamos simulacros.

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    1. Não sei se a palavra contém o mundo ou se o mundo contém a palavra.

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  2. Quando nos roubam as palavras resta-nos o silêncio e é por ele que nos vamos.

    Boa semana

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    1. Caminhar por dentro do silêncio.
      Contrapor este ao ruído, até ressacralizar a palavra.
      Boa semana.

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  3. A palavra faz falta à palavra. Calemos o silêncio que ensurdece.

    Boa semana.

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  4. Boa Semana.
    O silêncio é a gravidez da palavra, vida e não morte. O ruído ensurdece, o silêncio apazigua.

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