sábado, 8 de setembro de 2012

SE olhares muito atentamente para a mais ínfima porção de qualquer coisa conseguirás olhar o universo.(

(Antony Gormley) Por estes dias há uma pergunta que persiste. O que nos torna humanos? A forma? O Espírito? A civilização? O sentido de comunidade? A cultura em constante debate com a natura? As construções? A imaginação? A guerra? A protecção dos mais frágeis? A ambição transformadora?. Não pretendo responder, a construção da humanidade tem sido uma constante encruzilhada, salpicada por passageiros momentos onde a abundância camufla o conflito. Dependendo do momento em que cada um nasceu, a narrativa acerca do presente, passado e futuro vem envolta pelas condições e condicionantes desse mesmo tempo de início. Tenho retomado, mentalmente, muitas histórias que a minha bisavó Hermínia me contava sobre a sua infância. A minha Bisavó nasceu em 1905, era a mais velha de cinco irmãos, numa Lisboa cheia de ruralidade ali nos lados dos Campos das lides ( Campolide). A minha Bisavó recordava-se de o seu Pai ter albergado em casa republicanos que vinham fugidos do Terreiro do Paço, era ela pequenita. A minha Bisavó levava para a escola Pão com dentes, esta era uma das suas brincadeiras ingénuas, o Pão sem nada era Pão com Dentes. Para mim que nasci em 1970 e que vi o consumismo embriagar as gentes que o tomaram por liberdade, estas narrativas eram tão longínquas como os Amores de Pedro e Inês, pertenciam ao universo do "há muito muito tempo". A caminhada em que julgámos estar envolvidos chegou ao momento penhasco, não é possível permanecer no cimo do penhasco, aproxima-se o outono, em breve o mar encapelado deixará de convidar ao mergulho refrescante. A subsistência da espécie humana deve-se ao seu desapego geográfico, quero com isto dizer que sobreviver e caminhar para outros lugares são preposições intimamente ligadas. A ilusão sedentária é em si provocadora de conflitos e de desajustamentos que conduziram à morte de algumas comunidades. Convém aqui distinguir ficção e ilusão, uma ficção é uma construção que parte da imaginação e que propõe lugares outros, paralelos, já a ilusão parte da construção racional desviada, pretende substituir o lugar real por um outro que é o mesmo mas em estado ilusório. As ilusões são sobretudo manipulações das narrativas,e são potencialmente perigosas. Abandonar ilusões sem desprezar as ficções, ou se quisermos, deixar a política para não desprezar a arte. Não proponho um traço único que confirme a nossa humanidade, mas arrisco afirmar que se fosse possível eleger um único, elegeria a Arte, a ficção, o mundo paralelo que não amputa o mundo sensorial, antes o amplia.

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