segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Turbulência (PORTISHEAD live SOUR TIMES)






- Parece que a tempestade amainou, já não era sem tempo.
- Desculpe, mas não dei por nada, aqui continua tudo em turbulência - disse ela apontando para a cabeça.
- Não diga essas coisas assim, ainda assusta as pessoas.
- Sabe, pior do que assustar os outros é assustar-me a mim própria, às vezes é inverno durante todo o verão, ventanias e janelas a bater, o som do mar encapelado aqui na planura do nada, e eu a saber que as pessoas não sentem os meus temporais.
É como lhe digo, se a tempestade amainou foi aí fora, aqui continua tudo muito turneriano.
- Se não a conhecesse há tantos anos acho que a convidava para um chá e uma deliciosa fatia de bolo, mas sei que por estes dias anda a café, acertei?
- E há outra maneira de evitar o sono?
- Um dia ainda vai encontrar paz.
- Certamente, no dia que deixar de pensar e sentir e respirar, a menos que exista um além, coisa que duvido metódicamente, mas se isso acontecer serei o exemplo da alma danada por toda a eternidade. Apresse-se homem, aí fora parou de chover, aproveite e vá lá ao seu chá reconfortante.- Ela fugiu por entre umas arcadas de um prédio, deixando-o ali em suspenso.
- Epá,aquela tipa é um bocado doida, não achas? - comentou um outro que assistira sentado a todo o diálogo.
- Não é nada disso, parece que a rapariga é polar.- garantiu o dono do café.
- Polar? Como as camisolas? Ui, então deve ser quente -ironizou o homem sentado.
- QUal polar, qual carapuça, é bi - bipolar.- Afiançou um terceiro homem enquanto despejava um 1920 dentro da chávena de café.
- O quê? É bi? Ah... nunca tinha dado por nada, olhe que se é, é muito discreta, mas digo-lhe não precisava, ela até nem é feia de todo.
O primeiro homem, olhou para dentro do café, encolheu os ombros e saiu em passo acelarado, sem parar, percorreu as arcadas do prédio por onde ela tinha desaparecido.
A chuva torrencial regressou, sem contemplações nem pausas para chá.

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